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Abusividade na cobrança de taxa de conveniência em vendas online


Publicado 22 de janeiro de 2020 às 07:13     Por Silvia Missano Costa*     Foto Arquivo Pessoal

A venda de ingressos de shows e/ou espetáculos pode ser realizada de diversas maneiras, inclusive através de alguma empresa terceirizada e especializada nessa atividade, a exemplo do Sympla e Ingresso Rápido.

Quando a venda é realizada por alguma dessas instituições, é prática comum a cobrança de um valor adicional, apenas pelo fato de o consumidor estar adquirindo o ingresso por via online. Essa quantia extra é conhecida como taxa de conveniência.

O Supremo Tribunal de Justiça, em seu recente informativo nº 644, decidiu, no entanto, que a compra realizada pela internet não pode ser considerada automaticamente como uma conveniência ao consumidor. Isso porque, na prática, quase todos acabam adquirindo o ingresso de shows e espetáculos online, e, além disso, muitas vezes esse é o único ponto de venda disponível, o que geraria uma ideia de liberdade de escolha fictícia do consumidor. Nesses casos, a abusividade da taxa é latente, uma vez que o consumidor sequer possui a opção de abdicar dessa comodidade, ante a indisponibilidade dos ingressos em pontos de venda físicos.

A grande questão, no entanto, é que a verdadeira conveniência recai para os fornecedores, vez que a venda online acarreta inúmeras vantagens e aplicabilidades para os próprios promotores de eventos culturais, alcançando, por exemplo, um número muito maior de interessados no menor tempo possível, de forma que eles devem ser os responsáveis pelo pagamento das empresas que comercializam seus ingressos.

O desequilíbrio do contrato está configurado, uma vez que o consumidor se encontra em extrema desvantagem, arcando com os custos de uma conveniência que pouco lhe garante serventia, e que traz diversos benefícios ao fornecedor, situação vedada pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 39, inciso V.

Outra questão para ficar alerta, é que os produtores de eventos, além de cobrarem indevidamente a taxa de conveniência, comumente realizam tal cobrança sobre o valor de cada um dos ingressos individualmente adquiridos. Entenda: se há a aquisição de vários ingressos pelo mesmo consumidor, não existe razão plausível para cobrar várias taxas de conveniência se a vantagem seria única, em razão de uma mesma operação.

Ou seja, o que ocorre é que as empresas especializadas nas vendas dos ingressos se remuneram diretamente do consumidor, calculando lucro pela unidade vendida, por um serviço que deveria estar sendo pago por quem de fato aufere os benefícios, afinal, trata-se basicamente de um contrato de intermediação.

Acontece que tudo é calculado. O valor extra relacionado à taxa de conveniência, via de regra, varia em torno de 10% a 15% do valor do ingresso, o que geralmente representa um valor baixo e que desestimula o consumidor a lutar para ser reembolsado. A quantia paga pela esmagadora maioria do público e não reivindicada, provavelmente cobre e supera o valor gasto pelos produtores com eventuais ações de repetição do indébito, o que faz com que a conduta irregular seja recorrente.

Em síntese, a recomendação é que, caso o consumidor deseje o ressarcimento dos valores desembolsados à título de taxa de conveniência, reúna qualquer documento probatório da operação realizada, e procure o Juizado Especial que lhe seja mais conveniente, acompanhado ou não de advogado, para que possa reaver o que gastou a maior, e, assim, contribuir para o desestímulo dessa prática ilegal.

Silvia Missano Costa* é advogada, formada pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Atua no escritório Pimenta, Prado, Hora & Araújo, na área de Direito Civil, e é membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/SE.



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