Polícia
MPF denuncia policiais envolvidos na morte de Genivaldo por tortura, abuso de autoridade e homicídio
O Ministério Público Federal (MPF) denunciou por abuso de autoridade, tortura e homicídio qualificado os três policiais rodoviários federais que participaram da abordagem e morte de Genivaldo de Jesus Santos, que são: Paulo Rodolpho Lima Nascimento, William de Barros Noia e Kleber Nascimento Freitas. Os fatos ocorreram em 25 de maio, no município de Umbaúba, no Sul sergipano. A Justiça Federal aceitou a denúncia na terça-feira (11).
Atendendo a pedido do MPF, a Justiça também decretou a prisão preventiva de Paulo Nascimento, William Noia e Kleber Freitas para garantia da ordem pública e por conduta violenta reiterada. Os três agentes foram presos na sexta-feira (14), e se encontram detidos no Presídio Militar do Estado de Sergipe (Presmil) .
Denúncia
Na denúncia, o MPF afirma que as provas reunidas durante a investigação policial comprovaram que Paulo Nascimento, William Noia e Kleber Freitas submeteram Genivaldo de Jesus Santos a “intenso sofrimento físico e mental durante rotineira fiscalização de trânsito, impondo-lhe, na sequência, uma ilegal prisão em flagrante, e, ao final, causando a sua morte por asfixia, quando Genivaldo já se encontrava detido e imobilizado no ‘xadrez’ da viatura da Polícia Rodoviária Federal”. Ao longo da ação penal foi descrita a participação dos três agentes policiais nos fatos.
Tortura
Os atos violentos contra Genivaldo duraram aproximadamente vinte minutos, e a gravidade foi atestada pelo laudo pericial cadavérico do Instituto Médico Legal de Sergipe. O laudo afirma que Genivaldo de Jesus tinha lesões na maçãs do rosto, orelhas, pescoço, supercílios, cotovelos, joelhos, mãos, pés e punhos.
O laudo de perícia criminal federal (local de crime) da Polícia Federal afirmou que as lesões indicadas pelo IML “são compatíveis com a dinâmica analisada, em que Genivaldo de Jesus é imobilizado várias vezes, tem seu corpo pressionado pelos braços, joelhos ou pés de três policiais, e é jogado ou arrastado no asfalto”.
Ainda de acordo com o MPF, o laudo confirmou ainda que Genivaldo de Jesus não ameaçou os denunciados com violência em nenhum momento e afirma categoricamente que Genivaldo não reagiu, manteve uma posição defensiva e seguiu os comandos verbalizados pelos policiais, apenas questionando verbalmente o motivo da abordagem e das agressões.
No entendimento do MPF, os três agentes contrariaram normativos, manuais e o próprio padrão operacional adotado pela PRF e executaram múltiplos atos de violência contra Genivaldo de Jesus Santos, que estava sob a autoridade deles enquanto policiais rodoviários federais.
De acordo com a denúncia, Genivaldo foi submetido a “intenso sofrimento físico e mental, como forma de puni-lo, devido à atitude questionadora da vítima quanto ao procedimento de abordagem adotado pelos denunciados, inclusive a prisão ilegal que estes buscaram lhe impor com base em inexistentes crimes de desobediência e de resistência”.
Abuso de Autoridade
Ao ser imobilizado, Genivaldo foi informado de que seria levado em flagrante para a Delegacia de Polícia Civil em Umbaúba. O documento reforça que não se sustenta a narrativa dos denunciados de que Genivaldo teria praticado os crimes de desobediência e de resistência.
O MPF afirma que não havia situação prevista em lei para a prisão em flagrante “uma vez que Genivaldo não estava cometendo infração penal, nem havia acabado de cometê-la, não estando, portanto, em flagrante delito” e conclui que os policiais, ao imporem a prisão a Genivaldo, praticaram o crime de abuso de autoridade.
Homicídio qualificado
De acordo com a denúncia, após imobilizar Genivaldo de Jesus, os policiais rodoviários federais o colocaram na viatura, sob sua custódia. Neste momento, Paulo Rodolpho Nascimento acionou uma granada de gás lacrimogêneo e a lançou na viatura. Em seguida, Nascimento e William Noia fecharam a porta do veículo contra as pernas da vítima, causando a morte de Genivaldo por asfixia mecânica por exposição a agentes irritantes.
O documento afirma que o fechamento da porta teve o objetivo de “impedir a saída do gás e, com isso, aumentar a concentração da substância tóxica no compartimento” e durou quase dois minutos (1min55s). O grande volume de gás no local impediu que Genivaldo respirasse, o levando à asfixia.
As provas demonstraram que Kleber Freitas foi responsável pela proteção do perímetro onde a ação se desenrolou. Armado, deu cobertura para que William Noia e Paulo Nascimento agissem contra Genivaldo.
O laudo de local de crime da Polícia Federal e o laudo pericial cadavérico do IML/SE atestam que a vítima morreu por asfixia mecânica por exposição a agentes irritantes, resultante do alto volume de gás concentrado no ambiente confinado em que Genivaldo de Jesus se encontrava, a viatura policial onde foi colocado pelos agentes.
A denúncia afirma que, no Manual de Procedimentos Operacionais MPO–53 e no manual “Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo/SENASP”, empregados pela PRF, é destacado que o gás lacrimogêneo não deve ser usado em locais com restrição de escape, como estádios de futebol ou instalações prisionais, devido, entre outros fatores, ao fato de a quantidade de agente químico lacrimogêneo ser alta, “tornando o ar do ambiente confinado irrespirável”.
Mesmo com a ressalva explícita nos manuais de procedimento, o material foi usado em uma viatura policial, em um compartimento com volume de apenas 0,7 metros cúbicos, contra uma vítima algemada e que não representava risco aos policiais.
A denúncia reforça que os agentes desprezaram “a ampla gama de circunstâncias indicativas da iminente morte de Genivaldo em decorrência da conduta por eles perpetrada” e também “menosprezaram os avisos das pessoas que estavam próximas e a própria reação dolorosa da vítima submetida aos efeitos do gás”. Por fim, o MPF afirma que os policiais, “aceitaram o resultado fatal, que efetivamente se concretizou, demonstrando um completo desprezo pela vida de Genivaldo.”
Pedidos e penas
O MPF requereu à Justiça Federal que os policiais rodoviários federais sejam condenados pelos crimes de tortura, abuso de autoridade e homicídio qualificado.
O crime de tortura tem penas previstas de 02 a 08 anos de reclusão, podendo chegar, no caso, a 10 anos e 8 meses, por ter sido cometido por agente público e contra pessoa com deficiência. O abuso de autoridade tem punição prevista de 01 a 04 anos de detenção. E o homicídio qualificado tem penas mínimas e máximas previstas de 12 a 30 anos de reclusão.
Também foi requerido que, em caso de condenação, seja determinada a perda dos cargos públicos dos agentes e que a Justiça Federal fixe uma indenização de reparação por danos morais aos familiares de Genivaldo de Jesus Santos.
O processo tramita na Justiça Federal com o número 0800566-70.2022.4.05.8502.
Informações do MPF-SE
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